PEDRO JOCHEM - O IMIGRANTE

 

 

"Felizes, (...), as famílias que têm história, porque lhes é dado o júbilo de a recordar, porque ela constitui a fonte fecunda, inesgotável e profunda de suas energias morais; porque, a cada passo que dão, sentem atrás de si o rastro de sua própria imortalidade. Que é a vida, senão a história que começa? Que é a história, senão a vida que continua? A história de nossa família, de nossa gente, de nossa casa está conosco. Respira perto de nós. A sua presença todos adivinham. Ora bela, ora triste, é uma grande história".

Júlio Dantas
da Academia de Ciências de Lisboa,
in "Outros Tempos"


          O imigrante Pedro JOCHEM aos 26 anos de idade, solteiro, chegou ao porto de Desterro (hoje Florianópolis) a bordo do navio Vênus, em 28 de dezembro de 1846, depois de uma escala no Rio de Janeiro. De acordo com a relação de passageiros do Vênus, Pedro Jochem emigrou juntamente com

Miniatura do que teria sido o navio "Vênus" o qual transportou o imigrante Pedro Jochem, do Rio de Janeiro a Desterro - SC, em dezembro de 1846.

  Margaretha(não cita o sobrenome), com quarenta e quatro anos   de   idade, sendo os dois "parentes de João Wilberth" que   emigrou com   eles. João Wilberth era lavrador, viúvo e emigrou   com seus quatro   filhos(Nicolaus, Anna Maria, Maria e João).   Seu filho mais novo,   João, faleceu dia 29 de dezembro de 1846,   aos quatorze anos de   idade, em Florianópolis, antes de chegar   a colônia.

          Alguns meses depois, provavelmente em março de 1847,   Pedro Jochem foi instalado na localidade de Löffelscheidt, na colônia Santa Isabel, da qual é um dos fundadores. Löffelscheidt permanece com a mesma denominação e integra o município de Águas Mornas, localizado a aproximadamente 50 Km de Florianópolis, em Santa Catarina, Brasil.

 

 

 

 

 

Mapas do Brasil e do Estado de Santa Catarina com destaque para a região da Grande Florianópolis e nela o acesso rodoviário para a localidade de Löffelscheidt.

 

Certidão de Batismo de Peter Jochem.
Certidão de nascimento de Peter Jochem.

          Ele nasceu em 1820 ou 1821 na Alemanha e é filho de Matthias Jochem e de Susanna Back. Em 16 de julho de 1847 Pedro Jochem recebeu a lote de n. 5, com 100 braças de frente por 800 braças de fundo, lado direito do Caminho-de-Tropas, na Colônia Santa Isabel. Veja no Mapa abaixo a localização do lote de terras recebido por Pedro Jochem em Löffelscheidt, hoje município de Águas Mornas

 

 

Planta de Löeffelscheidt, colônia Santa Isabel, em 1847. Hoje Águas Mornas - SC.
Fonte: Arquivo do Instituto Martius-Staden, Ref.: G II a, Nr. 1048/1

          Veja o teor da certidão da demarcação e medição do lote de terras concedido ao imigrante Pedro Jochem:

Certidão da demarcação e medição do terreno que foi concedido por ordem do Ilmo. e Exmo. Sr. Presidente [da Província de Santa Catarina] ao colono PEDRO JOCHEM.

Certifico eu, Frederico Xavier de Souza, demarcador e arruador nesta Vila de São José que, passando ao lugar denominado "Cova da Canela" da extrema n.º cinco que divide com o colono João Wiber [Wilberth], medi e demarquei, a rumo do sudeste magnético, cem braças de terras de frente, onde se numerou depois de apontada para os fundos a extrema a rumo noroeste com o n.º sete que fica dividindo uma roça de mandioca de propriedade de José Antônio de Abreu que, na ocasião da medição já ali estava aposentado tendo, assim, cumprido as ordens de Sua Excia. segundo as Instruções que assim ordeno. E, por ser verdade todo o referido, passei e assinei a presente Certidão.

 

Vila de São José, 16 de julho de 1847

O Demarcador
Frederico Xavier de Souza

 

Fonte: Memoriais 286, p. 25. Termos das Medições de Lotes na Colônia Santa Isabel (1847-1848). Série: Memoriais de Lotes, Títulos Definitivos e Provisórios (1846-1930). Arquivo Público do Estado de Santa Catarina.

 

Pedro Jochem contraiu matrimônio com ANNA MARIA PETRI, talvez em 1847, e ficaram morando em Löffelscheidt. Ela nasceu em 1820 e faleceu em 02 de setembro de 1896; filha de Philipp Petri e de Maria Meyer.

Pedro JOCHEM e Anna Maria PETRI tiveram os seguintes filhos(a listagem pode não ser completa):

 
1. FELIPE JOCHEM - Nasceu em 1848 e dele não se tem mais notícias. Talvez faleceu ainda criança.
2. PEDRO JOCHEM - Nasceu em 29 de outubro de 1849 e faleceu em 23 de abril de 1925. Casou com Maria Loffi, com quem teve, aproximadamente, 10 filhos.
3. JOÃO JOCHEM - Nasceu em 17 de julho de 1853 e faleceu em 21 de setembro de 1911. Contraiu matrimônio com Catarina Loffi com quem teve 11 filhos.
4. CATHARINA JOCHEM - Nasceu em 03 de abril de 1856 e faleceu em 01 de janeiro de 1903. Casou-se com João Knies.
5. JACOB JOCHEM - Nasceu em 1858 e dele não se tem mais notícias. Talvez faleceu ainda criança.
6. JOSÉ JOCHEM - Nasceu em 22 de abril de 1860 e faleceu em 07 de outubro de 1953. Contraiu matrimônio com Margarida Hillesheim com quem teve 1 filha.

 

 

 

Casa que teria sido do imigrante Pedro Jochem, em Löffelscheidt, Colônia Santa Isabel, hoje Águas Mornas - SC. Acervo: ....................

 

FRAGMENTOS HISTÓRICOS DE PEDRO JOCHEM


          Pouco se sabe a respeito da vida e atuação do imigrante PEDRO JOCHEM. Em busca de informações sobre a sua vida localizamos os seguintes episódios envolvendo sua pessoa:

"Pedro Jochem, um colono de Santa Isabel, há alguns dias quando levou produtos à cidade, quase morreu afogado. O bote em que estava chegou ao Porto as 2h da madrugada. Estava muito escuro e, além disso, começou a chover. Para se proteger da chuva os passageiros desembarcaram do bote para se abrigar embaixo do telhado do trapiche. Quando Pedro Jochem tentava desembarcar, por faltar algumas tábuas no trapiche, pisou em falso, acabou caindo na água e involuntariamente afundou por duas vezes. Felizmente se segurou no pilar de sustentação do trapiche e conseguiu se desfazer do poncho que usava, do contrário não teria se salvado"(1) .

Em Löffelscheidt "quanto a engenhos de açúcar, tenho conhecimento de dois apenas. Um deles pertencia a Peter Jochem e trabalhava ainda quando eu era professor na povoação"(2) .


PEDRO JOCHEM - CIRCUNSTÂNCIAS DA EMIGRAÇÃO


          Entretanto o que muito nos chama a atenção é que Pedro Jochem emigrou solteiro, com um parente seu(João Wilberth), aos 26 anos de idade. Diante dessa realidade nos perguntamos: E sua família(pais e irmãos) por que não vieram com ele? Quem era Margaretha que imigrou com ele e que também era parente de João Wilberth? Qual a relação de parentesco com João Wilberth? De qual aldeia ele era procedente da Confederação dos Estados Alemães? Por que escolheu o Brasil como destino se poderia optar pelos EUA por ser mais perto e a passagem mais barata? Pedro Jochem era alfabetizado? Qual a razão maior que o fez emigrar? Em que contexto familiar Pedro Jochem tomou essa decisão? Depois de fixar-se no Brasil ele manteve contatos com seus familiares na Alemanha?

          Para tentar esclarecer parte das perguntas acima formuladas recorremos a literatura histórica e citamos os seguintes trechos: "Nem sempre a emigração significou deslocamento de um grupo de parentes para o mesmo lugar. Há várias referências de grupos que foram parcialmente para os EUA, para a Argentina e para o Brasil, como partes de um projeto maior de emigração: aqueles que encontrassem as melhores condições de reprodução social, chamaria os demais para a eles se juntar"(3). Esse seria o caso do imigrante Pedro Jochem? Acreditamos que não; mas é prudente descartar a hipótese?

          Mais adiante a mesma autora afirma: "Jovens solteiros, ao emigrar, seguiam o padrão de reprodução social de suas famílias de origem, na medida em que se afastavam da herança. Com certa freqüência eram como que adotados por outras famílias de emigrantes, igualmente desfavorecidas. Na condição de "addido", segundo a terminologia do século XIX, o jovem se tornava, [...] o marido ideal de uma das filhas do casal adotante: era filho de uma família conhecida, muitas vezes parente e, como não possuía recursos, não podia esperar que sua esposa fosse provida de um dote significativo. [...] É interessante observar que solteiros, que iniciam o projeto de emigração sem base familiar e sem apoio de laços de parentesco - isto é, além de solteiros, também "isolados" - eram incorporados a uma família durante a viagem"(4). Seria esse o caso do Pedro Jochem? Será que Pedro Jochem seria um filho não-herdeiro(muito comum na Alemanha) e, por isso, decidiu emigrar? Ele deve ter casado logo após sua chegada a colônia. Sobre a esposa de Pedro Jochem, Anna Maria Petri, temos os seguintes dados: "ANNA MARIA PETRI nasceu em 1820 e faleceu em 02 de fevereiro de 1896 em Löffelscheidt. Era filha de Philipp Petri e de Anna Maria Meyer. Embarcou na Europa clandestinamente com os irmãos(Bárbara, Philipp, Matthias, Margaretha e Joseph). Sem indicação do navio em que chegou a desterro e sem indicação de data em que entro na Colônia São Pedro de Alcântara"(5).

          Entretanto nossa autora diz: "A migração de solteiros não significa, porém, um desvinculamento com relação ao parentesco"(6). Mas, então, por que Pedro Jochem emigrou sozinho? Por que sua família não veio com ele? Ele manteve o vínculo com seus familiares na Alemanha?

          É preciso, ainda, considerar os resultados da aliança entre Estado-Igreja. De acordo com essa aliança "decorria a exigência, por exemplo, de que os camponeses provassem possuir o necessário para a instalação de um novo casal. Os não-herdeiros ou aqueles que ainda não tivessem recebido sua herança tinham suas possibilidades de casamento reduzidas ou eram até condenados ao celibato. [...] Em decorrência, é interessante observar o alto número de casamentos de emigrantes realizados logo após a chegada ao país de destino, e a presença significativa de "addidos" [...] entre as famílias que vêm para a América"(7). Seria então Pedro Jochem um não-herdeiro e, por isso emigrou(ele e Margaretha - sua parente), na condição de adido do imigrante João Wilberth?

          Seria conveniente considerar que, devido ao pauperismo de determinadas localidades européias levaram muitas autoridades da Confederação dos Estados Alemães e da Suíça a estimular a emigração de habitantes que se tornavam onerosos às respectivas administrações municipais. Para amenizar tal problema "várias municipalidades prontificaram-se mesmo a colaborar com os agentes de emigração adiantando ao emigrante as somas necessárias à passagem e sustento"(8). Seria, talvez, Pedro Jochem, um dos "onerosos às administrações municipais" e, por isso, foi "estimulado" por elas a emigrar?

          Teria Pedro Jochem idealizado em excesso a terra procurada, "terra prometida", criando imagens falsas e ilusórias a respeito da realidade do Brasil? Seria ele vítima dos agentes de emigração na Alemanha que "vendiam" o Brasil como "uma terra onde corre leite e mel"? Teria Pedro Jochem visto no Brasil infinitas possibilidades de "fazer e América" e "fazer-se na América" onde a capacidade de ação não encontraria estorvo e, por isso, resolveu emigrar?

          Essas e outras questões estão a espera de respostas para que possamos entender e reconstituir a biografia do imigrante PEDRO JOCHEM.

NOTAS DE FIM

1 - Jornal Kolonie Zeitung, Joinville/SC, n. 4, de 22 de janeiro de 1870.
2 - SCHADEN, Francisco. Notas para a história da localidade de Löffelscheidt. São Bonifácio: Ed. do Autor, 1946, p. 27.
3 - WOORTMANN, Ellen F. Herdeiros, Parentes e Compadres. São Paulo: HUCITEC e Brasília: Edunb, 1995, p. 107.
4 - WOORTMANN, Ellen F. Herdeiros, Parentes e Compadres. São Paulo: HUCITEC e Brasília: Edunb, 1995, p. 110.
5 - PHILIPPI, Aderbal João. São Pedro de Alcântara - A Primeira Colônia alemã de Santa Catarina. Florianópolis: Letras Contemporâneas, 1995, p. 250.
6 - WOORTMANN, Ellen F. Herdeiros, Parentes e Compadres. São Paulo: HUCITEC e Brasília: Edunb, 1995, p. 113.
7 - WOORTMANN, Ellen F. Colonos e Sitiantes. Tese de doutorado, Universidade de Brasília, 1988.
8 - HOLANDA, Sérgio Buarque da. "Prefácio". In: DAVATZ, Thomas. Memórias de um Colono no Brasil (1850). Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; São Paulo: Ed. da USP, 1980, p. 28.

 

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